Este artigo foi publicado originalmente no Deythere.
- Crise da Dívida dos EUA Atinge 38 Biliões de Dólares
- A Solução Bitcoin na História da Dívida
- A Matemática: Qual Teria de Ser o Preço do Bitcoin?
- Política, Praticidade e Restrições de Mercado
- O Que o Debate Revela Sobre Dinheiro, Crédito e Escassez
- Conclusão
- Glossário
- Perguntas Frequentes Sobre a Crise da Dívida dos EUA
A dívida nacional dos Estados Unidos ultrapassou os 38 biliões de dólares; um recorde histórico com sérias implicações.
Entretanto, os defensores do Bitcoin argumentam que o seu modelo de oferta fixa é uma alternativa radical ao dinheiro fiduciário e ao sistema baseado em dívida que o sustenta.
Comentários recentes sugerem até que o Bitcoin poderia “eliminar” a dívida dos EUA.
Crise da Dívida dos EUA Atinge 38 Biliões de Dólares
No final de outubro de 2025, a dívida nacional dos EUA ultrapassou os 38 biliões de dólares; o aumento mais rápido fora de um contexto de pandemia em apenas alguns meses.
Per capita, isso representa mais de seis dígitos por cada cidadão americano.
O ritmo acelerado do endividamento reflete défices fiscais persistentes, custos de juros crescentes e pressões demográficas sobre os gastos obrigatórios.
Analistas alertam que esta dívida traz riscos ao crescimento, à inflação e à credibilidade do crédito norte-americano.
Neste contexto, a ideia de que o Bitcoin possa ser uma solução tem ganho força, ainda que com grandes reservas.
A Solução Bitcoin na História da Dívida
O apelo do Bitcoin vem da sua oferta fixa limitada a 21 milhões, em contraste com a capacidade dos governos de emitir quantidades ilimitadas de moeda fiduciária.
A natureza finita do Bitcoin destaca as limitações do atual sistema monetário e fiscal.
Políticos como Cynthia Lummis já chegaram a propor que os EUA mantenham Bitcoin como ativo de reserva soberano, afirmando que poderia “respaldar o dólar com um ativo sólido e auditável”.
Na essência, o Bitcoin não está a ser proposto como um mecanismo de pagamento da dívida, mas como uma proteção, uma reserva alternativa de valor e parte de uma reavaliação mais ampla dos sistemas de dívida baseados em moeda fiduciária sob pressão.
A Matemática: Qual Teria de Ser o Preço do Bitcoin?
A análise começa com um cálculo simples.
Dividindo a dívida dos EUA de 38 biliões de dólares pelo fornecimento total de 19,93 milhões de Bitcoins, obtém-se um valor teórico de paridade da dívida por moeda: cerca de 1,9 milhões de dólares por Bitcoin.
Mas este cálculo pressupõe que os EUA detenham todos esses Bitcoins, o que não é o caso.
Segundo os dados disponíveis, o governo norte-americano possui cerca de 326.373 BTC (1,6% da oferta total).
Usando esse número menor, obtém-se uma avaliação de cerca de 116,5 milhões de dólares por Bitcoin, o que implicaria uma capitalização de mercado global de aproximadamente 230 biliões de dólares, mais do que o dobro do PIB mundial.
Ao ajustar pela estimativa de que cerca de 20% de todos os Bitcoins extraídos (cerca de 4 milhões) estão perdidos para sempre, restariam cerca de 16 milhões em circulação efetiva, elevando o valor de “paridade da dívida” para acima de 2 milhões de dólares por moeda.
A conclusão é que, matematicamente, usar o Bitcoin para simplesmente “apagar” a crise da dívida dos EUA é profundamente impraticável.
Política, Praticidade e Restrições de Mercado
Mesmo que os números se aproximassem desses valores, existiriam múltiplas restrições estruturais.
Primeiro, o volume diário de negociação do Bitcoin, cerca de 60 a 70 mil milhões de dólares, é minúsculo comparado com os mercados globais de obrigações e câmbio, que movimentam 7,5 biliões de dólares por dia.
Tentar liquidar posições grandes para resolver a dívida dos EUA provavelmente faria colapsar o mercado antes que houvesse qualquer alívio significativo.
Além disso, os EUA detêm apenas uma fração da oferta total, pelo que não poderiam realisticamente usar as moedas para pagar as suas obrigações.
O Bitcoin também não é emitido por nenhum governo; usá-lo como instrumento de pagamento levanta grandes questões de contabilidade, respaldo de reservas, enquadramento jurídico e transparência fiscal.
Propostas como a criação de uma “Reserva Soberana de Bitcoin” são altamente especulativas e carecem de consenso.
Embora alguns mercados e fóruns políticos vejam o Bitcoin como uma proteção macroeconómica, ele está longe de ser uma solução viável para a dívida soberana.
O Que o Debate Revela Sobre Dinheiro, Crédito e Escassez
Embora a ideia prática de o Bitcoin pagar a dívida dos EUA seja impossível, o debate revela temas mais profundos.
Mostra que um dos maiores governos da história está a acumular passivos mais rapidamente do que os mercados conseguem fornecer garantias credíveis.
A assimetria entre o endividamento ilimitado (fiat) e os ativos escassos (Bitcoin) está a impulsionar a discussão sobre o verdadeiro significado do dinheiro em tempos de tensão fiscal.
O cálculo “Bitcoin versus dívida” expõe uma verdade mais profunda sobre as finanças modernas.
A conversa também demonstra o crescente interesse institucional no Bitcoin, não apenas como um ativo especulativo, mas como parte de uma estratégia macroeconómica num contexto de défices persistentes.
Neste sentido, o Bitcoin é um contraponto simbólico à expansão ilimitada do crédito, mais do que uma solução literal para a dívida soberana.
Conclusão
A ideia de que o Bitcoin poderia eliminar a crise da dívida dos EUA é apelativa, mas não resiste à análise.
A oferta fixa do Bitcoin, embora conceitualmente atraente num mundo de passivos em expansão, não se traduz numa forma de pagar biliões de dólares em dívida soberana.
A liquidez de mercado, as limitações de propriedade e as questões estruturais relacionadas com políticas fiscais e enquadramentos legais são grandes obstáculos.
O simples facto de esta conversa existir mostra quão grave é a ansiedade fiscal — e como o Bitcoin se tornou parte essencial da discussão sobre dinheiro, crédito e contas públicas.
Em suma, o Bitcoin pode não apagar a dívida dos EUA, mas faz parte da conversa.
Glossário
Bitcoin (BTC): Moeda digital descentralizada com um limite máximo de 21 milhões de unidades.
Ativo de reserva soberano: Ativo detido por um governo para sustentar a sua moeda ou sistema financeiro.
Proteção macro (macro hedge): Ativo usado para reduzir a exposição a grandes tendências económicas ou fiscais.
Liquidez de mercado: Capacidade de comprar ou vender um ativo sem provocar grandes variações de preço.
Dívida nacional: Valor total devido por um governo a credores, incluindo dívida pública e obrigações internas.
Perguntas Frequentes Sobre a Crise da Dívida dos EUA
Manter Bitcoin reduz a dívida de um país?
Não. Deter Bitcoin não reduz passivos, a menos que seja vendido e convertido em moeda ou equivalentes.
Nos EUA, vender grandes quantidades de BTC poderia colapsar o mercado e torná-lo ineficaz como ferramenta de pagamento da dívida.
Quantos Bitcoins detém o governo dos EUA?
Cerca de 326.373 BTC (1,6% da oferta total).
Porque é que os EUA não podem simplesmente emitir Bitcoin para pagar a dívida?
Porque o Bitcoin é descentralizado e não é controlado por nenhuma entidade.
Emitir novos tokens quebraria o protocolo. Não é um ativo emitido pelo governo como a moeda fiduciária.
Poderia o Bitcoin, a um preço futuro, cobrir os passivos dos EUA?
A matemática mostra que seriam necessários valores extremamente elevados (milhões de dólares por moeda), o que é impossível devido à profundidade de mercado, liquidez e restrições estruturais.
